No dia Mundial do Teatro trago-vos a entrevista de uma actriz que admiro.
Antes de a ver em palco, conheci-a num ambiente escolar, foi professora de expressão dramática do meu filho. O primeiro contacto foi estranho, senti que tinha uma capa a protege-la, mas essa impressão, não passou disso mesmo. Acredito que tem um futuro brilhante à sua espera nos palcos. Quando as respostas a esta entrevista chegaram, vibrei ao ler, espero que assim seja com vocês.
A Música que a Mariana escolheu para acompanhar esta entrevista é da Ana Carolina - Beatriz .
Em que altura da vida sentiu que o seu caminho passaria por pisar o palco?
- Eu tive uma infância privilegiada…a minha professora primária fazia questão de nos mostrar exposições, de nos levar a assistir a peças de teatro infantil (lembro-me sobretudo dos espectáculos da Companhia Pé de Vento, no Teatro da Vilarinha, no Porto). E participei também, graças à minha
professora, na inauguração da casa da música, através de um projecto de serviço educativo. Também tive aulas de guitarra, mas desisti. Eu gostava de experimentar imensa coisa. .. na altura queria ser cantora!
Mais tarde, aos 13 anos, decidi que queria fazer teatro, insisti tanto, que a minha mãe inscreveu-me no Balleteatro. E na primeira aula disse logo à minha professora: “Quero ir estudar teatro. Quero ser actriz”, a partir daí não voltei a mudar de ideias.
";A grande atração do teatro, para o ator, especialmente para o ator quesabe que é ator, é esse tipo de jogo humanista que deve ser o mesmo e ao mesmo tempo muitos outros.”
Hugo Gutierrez Vega
Concorda com esta afirmação?
- Sim, sem dúvida! O teatro é um exercício de humanidade….Somos uma espécie de antropólogos, mas na prática…colocamo-nos no lugar dos outros, nas palavras de outras pessoas, e em situações, que, muitas vezes, só pudemos imaginar e isso é muito especial.
Mas claro, nunca deixamos de ser nós próprios e a interpretação que cada actor faz de uma personagem, é muito diferente, porque trabalhamos com o nosso corpo, a nossa identidade, a nossa imaginação. Por isso cada interpretação é única e diferente.
Sou muito feliz porque trabalho com pessoas e emoções.
Sempre conseguiu abstrair-se de si quando sobe ao palco e deixar a personagem no palco quando vem para casa?
- Eu sinto que estar em palco é uma espécie de “voo”, é uma viagem…tem
esse carácter evasivo, sim!
Ao mesmo tempo é um exercício de constante alerta, de estar no momento
presente, de atenção e contracena com o que nos rodeia.
Durante o processo de procura de personagem sou um pouco obcecada…e essa busca acabo por transportar para o meu dia-a-dia, para o que observo, mas, depois, tenho facilidade em abstrair-me, até porque preciso de sanidade mental (Risos).
Que papel lhe falta fazer?
- Tento sempre acreditar que o que me falta é o que estiver a fazer no momento. Acho sempre que são presentes. Mas falta-me fazer imensa coisa….acho que os actores da minha geração, em Portugal, de um modo geral, precisam de mais oportunidades e de ver o seu trabalho mais valorizado e de projectos que lhes permitam crescer artisticamente.
Houve algum papel que tenha dado luta (na construção da personagem, ou mesmo para a deixar quando a peça acaba)?
- Sim! O último que fiz, no espectáculo “The Butcher Show”, com a companhia Sui Generis…foi um grande desafio! Era uma personagem que passava por imensos estados durante o espectáculo. E o próprio espectáculo era…Sui Generis! E genial…escrito pelo Tiago Filipe, a partir do 1984 de George Orwell.
Quem assiste ao teatro nos dias de hoje, é um público de mente
aberta, ou ainda estão muito agarrados aos estereótipos do teatro certinho e direitinho?
- Creio que existe um pouco dos dois mundos…as pessoas mais velhas, de um modo geral tendem a procurar uma programação talvez mais “convencional” ou que vá de encontro ao que podiam ver há uns anos.
Mas não acho que isso seja necessariamente mau. Acho que arte deve ser plural e chegar a todas as pessoas.
Mas, claro, a arte, neste caso o teatro, é um espaço de liberdade, que deve acompanhar o mundo e o tempo. No fundo, o importante é que as pessoas vão ao teatro.
Sente que o teatro é uma arte "ameaçada" por tantas outras formas de fazer arte, ou pelo contrário, o teatro tem uma vida muito própria e convive bem com o que se passa à sua volta?
- Não acho que o teatro seja ameaçado por outras formas de arte, acho que todas as formas artísticas podem conviver entre si. Acho que há outras coisas…que talvez não sejam artísticas, mas se enquadrem mais na área do entretenimento, que fazem com que as pessoas não vão tanto ao teatro.
Mas, sim, acho que estamos muito desligados uns dos outros. Ir ao teatro é acima de tudo uma experiência social, que vive da presença física do público…e... há talvez mais telemóveis a tocar nas plateias do que havia há uns anos atrás.
Qual foi o local mais estranho onde fez teatro?
- Talvez…numa casa antiga, na Calçada do Combro…num espectáculo de terror imersivo, do Teatro Reflexo, no espectáculo Ímpios. Começava dentro de um armário, talvez tenha sido esse...
E o improviso, como é ter de lidar com o improviso no palco?
- É necessário, eu diria! No início gostava de ter tudo sob controle...hoje em dia, já fico mais relaxada com os imprevistos que podem acontecer a qualquer momento…
Improvisar, enquanto exercício é muito divertido e muito rico nos processos de ensaios, porque nos permite encontrar coisas novas, que muitas vezes não estávamos à espera.
A arte cénica deve ser apresentada aos mais jovens? Que benefícios pode trazer na vida deles?
- Sim, sem dúvida! Tenho trabalhado com crianças, sobretudo, e o teatro é essencial, como motor da imaginação, para melhorar a comunicação e para brincar… que é tão importante! Porque o teatro vive do jogo, que se estabelece na relação com o outro, esse jogo do faz -de -conta é muito natural nas brincadeiras das crianças e o ensino da expressão dramática, pode ser lecionado de uma forma lúdica e recuperar essas brincadeiras e desenvolvê-las através das ferramentas do teatro.
Neste momento está em cena com alguma peça de teatro?
- Neste momento estou focada no Mestrado, na área de Teatro e Comunidade.
Há possibilidade de ser reposto o espetáculo que referi “ The Butcher Show” e vou começar a ensaiar um espectáculo sobre a violência doméstica, com a companhia Teatro do Elefante, “Puta que pariu”, que vai estrear no próximo ano lectivo. Mas, infelizmente, com o actual estado do país tudo isto está suspenso.
Deixe-nos um pensamento sobre o teatro, o estar em palco e o que
sente quando tal acontece.
- O teatro é uma paixão... é uma parte muito importante na minha vida.
Vão ao teatro, vão, vão.
Retiro de um monólogo que escrevi e interpretei recentemente:
“Eu queria um espaço maior para poder inventar um vida. Ou várias.”
Obrigado Mariana, por abrir uma fresta da porta da sua visão do teatro.
Feliz Dia do Teatro! E que viva o Teatro sempre!
Beijos e abraços para todos!
Sandra C.
Uma entrevista muito interessante, sem dúvida :).
ResponderEliminarBeijinhos
Blog: Life of Cherry
muito interessante!
ResponderEliminarConheci a Mariana no âmbito do gosto pela música da Mafalda Veiga, só muito mais tarde soube que era atriz. Gostei muito da entrevista, uma visão jovem do teatro.
ResponderEliminarBeijinho.