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O Segredo (Parte IV)


                   Foto by Pinterest

Hoje trago-vos mais um excerto deste texto. E o que vos posso desvendar mais?
Posso dizer-vos que a inspiração veio de vivências, assim como também do dito filme que vos falei na semana passada. Como ninguém avançou com ideias, eu digo-vos que estou a falar da "Casa dos Espíritos" da Isabel Allende.
Posso-vos também dizer que a narradora (ou a voz dela/Lisy) encontra-se presente, ao longo de todo o texto.

"(...) Estava a ler para me manter calma, estava num tal estado de ansiedade. 
A todo o momento esperava que Frank entrasse pela sala dentro. 
Tinha tantas saudades dele...
De repente começo a sentir perto do meu pescoço uma brisa, um sopro fresco que não sabia de onde vinha. Senti a espinha a arrepiar-se, voltei-me intrigada... e nada, ninguém, nem uma janela aberta.
Continuei a ler, eu bem tentava manter-me concentrada, mas existia algo naquela sala que teimava em desconcentrar-me. Voltei a sentir a brisa. 

(De repente ouve-se um murmúrio):

Peter- Lisy, anda brincar comigo. Vamos brincar às escondidas.

(Lisy larga o livro, levanta-se e pergunta):

Lisy- Quem está ai?

(Silêncio)

Quem é que está a falar comigo?

(Peter ri-se e responde-lhe):

Peter- Lisy, sou eu. Já não te recordas de mim?

(Lisy mostra-se intrigada, mas volta a sentar-se e abre o livro de novo.
Pouco tempo depois entra Frank e dirige-se às costas da Chaise Long e acaricia os cabelos de Lisy. Ela responde):

Lisy- Não, não conheço a tua voz, talvez se tu me quiseres ajudar eu me consiga lembrar.

Frank- Então não me conheces? Muito bem.
Então acho que me posso ir embora. Adeus.

Lisy- Frank, meu querido. Tenho tantas saudades tuas.

Frank- Então em que ficamos? Afinal conheces-me ou nem por isso?

Lisy- Não ligues, estava só a falar alto.

E abraçamo-nos. O meu coração batia tão forte, que parecia querer sair do peito. Que emoção voltar a tê-lo perto de mim. 
Era difícil admiti-lo, mas gostava mesmo dele. Ouvir a sua voz era como música para o meu coração.

Frank- Então Lisy, conta-me as novidades!

Lisy- As novidades já são velhas, não há nada de novo.
E Londres, como está a cidade da pasmaceira?

Frank- Não digas isso? Não sejas injusta.

Lisy- Eu, injusta? Eu não sou injusta, é o que sinto.
Aquelas pessoas fazem-me impressão, são tão hipócritas, só olham para o próprio umbigo, só se preocupam com o seu bem - estar, tudo o resto à volta é como se não existisse.

Frank- Muito bem. Então, se eu também estou incluído nesse rol dos hipócritas e egoístas, não sei o que estou a fazer aqui...

Lisy- Não Frank, tu sabes que não estou a falar de ti.
Não me interpretes mal, tu não és assim.

Frank- Se tu o dizes, fico muito mais descansado. Sabe mesmo bem voltar ao campo, o ar que se respira é outro.

Eu olhava para Frank. Deu-me uma vontade de lhe dizer o quanto gostava dele, o quanto morria de ciúmes só de pensar em todas aquelas meninas coquetes que andavam de volta dele. 
Mas tinha medo de o perder, preferia usufruir da sua companhia.

Frank- O que se passa? Estás a olhar para mim? Tenho alguma nódoa no casaco?

Lisy- Não, não tens nada. Estava só a olhar para ti, há tanto tempo que não faço isso. Gosto muito de te olhar.

Frank- Estás a deixar-me sem jeito. Estás cada dia mais bonita, os teus olhos cada vez brilham mais.

Lisy- É de felicidade. Apesar da companhia da Nanny e do Olivier, sinto-me muito sozinha... sinto falta de conversar contigo.
Passávamos tantas horas na conversa... estou aqui há um mês e para falar com alguém, quase que tenho de forçar a Nanny a sentar-se ao pé de mim, se não fosse assim, falaria apenas com as paredes.

Frank- Minha querida... não te quiseste afastar de tudo? O preço por querermos ser diferentes paga-se caro...

Lisy- Não vamos falar disso agora, conta-me como vai o teu trabalho?

Frank- Nesta altura do ano pouco há para fazer, as pessoas vêm todas para o campo passar férias, tenho o consultório às moscas...

Lisy- É normal, não há ninguém que não esteja saturado da vida que leva naquela cidade. Mas nem tudo é mau, pelo menos pudeste tirar umas férias e eu usufruo da tua companhia.

Frank- E os teus sonhos? Continuas a tê-los?

Lisy- Oh Frank eu bem tento não pensar em tal coisa, mas não consigo.
Agora já não são só sonhos, ainda há pouco antes de chegares, comecei a ouvir a voz de uma criança a pedir para eu ir brincar com ela.
Eu vou dar em doída com isto...

Frank- Tem calma, não penses assim, para tudo existe uma explicação.

Lisy- Não sei... acho que começo a duvidar dessas explicações.
Eu sei que tu és médico, mas acho que não me consegues convencer.

Frank- Tens de confiar mais em ti Lisy. Se não te convenceres que vais encontrar uma solução para esta questão, vais continuar a atormentar-te, quando o intuito deste retiro seria encontrares-te a ti própria.

(Por momentos fica-se em silêncio e Frank reflecte sobre o que disse):

Desculpa-me Lisy, não queria ser bruto contigo, acho que estou cansado da viagem. Vou até ao quarto, tomar um banho e mudar de roupa, desço para jantar. Não ficas aborrecida que te deixe sozinha, pois não?

Lisy- Não, vai descansar. Eu fico bem não te preocupes...

(Frank sai de cena. Lisy fica sozinha. Apesar de inquieta começa a ler.
Após um breve momento, olha o infinito e diz):

Porquê? Porquê eu? Eu só queria viver a minha vida tranquilamente, mais nada. Será que é pedir muito?(...)"

Aqui fica mais um excerto deste texto....
Espero que gostem.

Beijos e abraços
Sandra C.

Comentários

  1. Esta parte desconcertou-me! Esta história está cada vez melhor. Obrigada por teres decidido partilhá-la *-*

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