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João Rodrigues - Uma pequena história da sua vida...



A entrevista que vos trago hoje, é de um senhor que teve uma extrema importância na minha vida e a responsabilidade de me levar para cima de um palco, faz hoje 22 anos.
O Sr. João já antes me tinha dado uma entrevista,, podem vê-la aqui no Consciências Teatrais.
Hoje, para além do Teatro, fala-se também um pouco da vida antes da revolução de Abril.
Espero que gostem...


O Sr. João é natural de Portimão. Na época antes do 25 de Abril ainda vivia lá, ou já tinha vida estabelecida na zona de Belas?
- Sim sou natural da Freguesia de Portimão, Concelho de Portimão. Vivi em Portimão até 1970, ano em que vim trabalhar para a Sorefame.

Como corria a vida? De forma calma e pacifica ou tem conhecimentos de problemas e atritos?
- Na Província a vida é muito calma, mas sempre que havia novidades sociais ou politicas, era nas
diversas colectividades que a informação chegava, em Portimão assisti em 1958 á campanha eleitoral do General Humberto Delgado, sem atritos claro o povo saiu todo á rua, sabia bem o que o que estava em jogo.

Também esteve na Guerra do Ultramar? Se sim, em que altura tal aconteceu? E como foi gerir tudo o que aconteceu?
- Sim fui mobilizado para a Guerra do Ultramar para Moçambique no ano de 1965 foram muitos meses (29) fora da família, foram tempos de muita angustia e sofrimento na zona de guerra, com alguns camaradas a tombarem ali bem perto de nós.

Na altura já estava ligado à cultura? Existia facilidade/liberdade de criação de uma peça de teatro?
Ou tinha que se dar voltas ao texto de forma a esconder algumas "informações" menos politicamente corretas? Onde ensaiavam? Para por uma peça de pé, como faziam? 
Havia as ditas ajuda de custo, ou saia dos vossos bolsos?
- Antes de ir para a tropa era organizador participante na “JOC” Juventude Operária Católica, aí havia debates e eventos culturais com alguma regularidade, não tínhamos nessa altura motivações teatrais, mas sim laborais. Já mais tarde eu e um amigo, escrevemos uma peça de teatro “A Vida do Pescador”, um pequeno texto para iniciarmos teatro com um grupo de amigos filhos de pescadores. Na Casa dos Pescadores, sede social dos pescadores, conseguimos apoios, e um espaço para ensaiar seria também aí representada a peça, mas infelizmente disseram-nos que a peça era muito demagógica, claro havia sempre um lápis azul, e foi o fim, isto em 1961.
Ainda antes do 25 de Abril, corria o ano de 1972, o Clube de Pessoal da Sorefame abriu um curso de
teatro, começamos com o método Stanislavsky, criação da personagem, no fim do curso foi escolhida a peça de teatro que tivesse em conta a política actual, foi escolhida a peça “O Cravo Espanhol” de Romeu Correia, tínhamos todo o apoio do Clube Sorefame e também da Filarmónica da Amadora onde iria ser exibida a peça. 
Quando estamos quase no fim dos ensaios, deu-se o grande dia da Liberdade o 25 de Abril, como o professor e encenador era um militante e dirigente politico na clandestinidade, teve que abandonar este projecto para se dedicar á revolução de Abril, e assim foi tudo por água abaixo.

Quando se deu o 25 de Abril onde estava? Como soube o que aconteceu? Nesta zona sentiu-se muito? As pessoas vieram para a rua comemorar? Ou foi tudo muito mais pacífico? 
- Quando se deu o 25 de abril estava em Belas e fui trabalhar porque não sabíamos bem o que esta
acontecer, da Sorefame seguimos para Lisboa, durante as primeiras horas da manhã foi a expectativa na confianças dos militares para derrubarem o poder instituído, e foi o dia maravilhoso.

Este dia mudou o rumo deste nosso Portugal... foi tudo positivo, ou também houve coisas que aconteceram com as quais não concordou? Politicamente quem agarrou o touro pelos cornos, fez-o bem? 
- Numa revolução existe sempre 80% de acção positiva o restante não conta muito, claro que quem agarrou o touro pelos cornos, não agradou a todos e isso era impossível de pensar, os quadrantes políticos moveram-se para agradar as suas classes sociais.

Sempre que existia um espectáculo a casa enchia-se, ou as pessoas tinham medo de vir assistir? 


- A seguir ao 25 de Abril, muita gente deu largas à sua imaginação, foi o que aconteceu em Belas, com o apoio do MDP eu formei um grupo de teatro “Pé de Galo” em 1975 estreamos no Cine Teatro do Povo a peça escrita pelo grupo “As Histórias da Avozinha” sala cheia de crianças, representações na Idanha no GB 22 de Maio, na Venda Seca nos Recreios e ainda num palco improvisados no Bairro do Pego Longo, sempre com casa cheia, depois nunca mais parei até ao ano de 2000.

Culturalmente falando, no pós 25 de Abril o que mudou?
- A cultura a arte ou qualquer expressão plástica, sem liberdade não é a mesma coisa, Portugal em 25 de Abril de 1974 libertou-se das grilhetas que oprimia o povo, e quem mais sentia na pele era as os políticos em 1º lugar e todos os artistas nas diversas formas de fazer arte em 2º, por isso a cultura e a arte andavam de mãos dadas na rua com o povo. 
Hoje já não é a mesma coisa a cultura e arte vão-se esbatendo, a falta dos apoios necessário, são gritantes e os intervenientes nestas áreas desmotivam, os tempos mudam, e mudam-se as vontades.

Um muito obrigado pela disponibilidade.

Beijos e abraços para todos!
Sandra C.

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