Caricatura da Mafalda
No dia em que se comemora o Dia Mundial do Teatro, deixo-vos a entrevista de alguem que admiro muito.
Conheci a Mafalda já nem sei muito bem como, mas partilhamos o mesmo amor pelo Teatro Amador.
Desejo-te que continues com essa garra que tens tido e que leves sempre em frente a tua vontade de fazer Teatro!!
Mafalda, tu és encenadora de um grupo de Teatro amador. Há quanto tempo desempenhas este "papel"?
- Comecei por adaptar e encenar dois contos tradicionais portugueses em 2002, quando o meu saudoso encenador Malaquias de Lemos já se encontrava debilitado.
Em efectivo, por passagem de testemunho do mesmo e compromisso da minha parte, assumi a encenação do grupo em 2003.
Foto do Grupo na peça "Biblioteca Encantada" de Iris Pitacas
Qual o grupo que estamos a falar?
-Falamos do Grupo Cénico da Sociedade Filarmónica Incrível Almadense, uma respeitosa Colectividade que caminha para os seus digníssimos 171 anos de vida activa e ininterrupta.
Também és actriz ou já foste?
- Fui e sou. Comecei no grupo Cénico da Incrível Almadense em 1997, como ponto. Por desistência de uma das actrizes que fazia o papel de Ester em “As Quatro Estações”, de Romeu Correia, foi forçoso subir ao palco.
A partir dessa altura o encenador não mais deixou de me atribuir papéis nas peças que encenava e, a partir de 2003 coube-me assumir o comando do grupo por falecimento do mesmo. Embora predominantemente seja encenadora, há alturas em que me vejo forçada a substituir alguma actriz que se ausente do grupo, para que o trabalho colectivo prossiga sem mais sobressaltos.
Trabalhar num grupo amador tem destas coisas.
Isto da encenação aconteceu por acaso?
- Não sei se lhe chame “acaso” ou “destino”. Ser encenadora não era algo que cogitasse. Tornei-me encenadora do grupo por força das circunstâncias ou, por outras palavras, porque o bem colectivo se sobrepunha ao particular. Não era uma função para a qual estivesse devidamente preparada mas, com a ajuda do que havia aprendido com o encenador e dos elementos mais antigos do grupo, com vasta experiência, acabei por ir desenvolvendo e aprimorando essa tarefa que hoje desempenho com agrado e entusiasmo.
Como te preparas, ou como preparas as encenações dos teus trabalhos?
- Eu gosto de trabalhar em colectivo e de envolver todo o grupo no trabalho do princípio ao fim.
Peço sugestões de peças e eu própria sugiro textos. Depois de ser aceite pelo grupo, “investigo” sobre o autor e a época. De seguida pego no texto e começo então a trabalhar a nível de encenação que, posteriormente, é debatida em grupo.
Quais são as maiores dificuldades, com que te debates?
- A primeira é a dificuldade financeira, que é comum a todos os grupos amadores, certamente. “não se fazem omeletes sem ovos””. Os recursos financeiros para se fazer a montagem de um espectáculo são difíceis de conseguir e ou há apoio das autarquias ou é incomportável desenvolver a actividade.
E, neste ponto, refira-se que me insurjo completamente contra a teoria de que os grupos são “subsídio-dependentes”. O ponto de partida está errado.
Os apoios que os grupos recebem para desenvolver uma actividade cultural ao serviço da comunidade não devem ser encarados como subsídios mas sim como um pagamento por um serviço prestado; serviço esse que compete ao Estado e que este não realiza por falta de condições/capacidade de o fazer ou mesmo vontade.
A segunda dificuldade que sinto é o tempo; os amadores estão condicionados na sua disponibilidade. Não é fácil coordenar um trabalho de acordo com as diferentes disponibilidades dos elementos do grupo porque, como sabemos, hoje em dia os empregos têm, cada vez mais, horários por turnos.
Conjugar o tempo disponível de todos é uma tarefa quase heróica.
Ser encenadora tem a ver com tua verdadeira profissão ?
- Não, nada. Sou técnica administrativa. Ser encenadora é uma actividade de lazer em primeiro lugar e um compromisso de participação na vida da comunidade e seu desenvolvimento cultural.
Qual a tua opinião sobre o estado do Teatro Amador em Portugal?
- É uma actividade que existe, insiste e persiste mas que continua a ser, cada vez mais, asfixiada.
Se o teatro profissional está a ser asfixiado, imagine-se então o amador, com menos recursos e apoios. Paralelamente a essas dificuldades deparamo-nos, ainda, com o ritmo de vida moderno, sempre a correr e sem tempo para nada, coadjuvado por uma cultura de mediocridade intelectual, repleta de programas de TV vazios de tudo e cheios de nada, de redes sociais onde imperam a frivolidade e mesquinhez.
Vais tendo casos de novas pessoas, a querer fazer Teatro e a disponibilizar-se para tal?
- Talvez por ter a sorte de viver na cidade denominada como “A cidade do teatro” me apareçam novas pessoas. Almada tem uma tradição muito vincada de teatro. É uma cidade “sui generis” nesse campo e de que muito me orgulho.
Apesar das dificuldades, de todos os cortes feitos à cultura, ainda subsistem e resistem mais de uma vintena de companhias de teatro na cidade.
Como adaptas a tua vida pessoal aos trabalhos no Grupo de Teatro?
- Não é fácil. Poucas horas de sono, pouco tempo para mim e para a família e muita força de vontade.
Por vezes os textos deambulam na mesa da cozinha entre a preparação das refeições ou entre a limpeza da casa e a arrumação das roupas.
Achas que ainda existe um estigma que este tipo de desempenho ( de encenadora), terá de ser feito apenas por homens?
- Acredito que haja, mas não aqui na minha cidade ou na minha colectividade. Nunca senti isso.
Já alguma vez colocaram em causa o teu trabalho por seres mulher?
- Não, nunca.
Deixa uma mensagem como mulher, sobre o Teatro
- O teatro não é uma actividade que se defina por sexo. É cultura e a cultura é de todos e para todos.
Alimenta-se do amor à arte e do intelecto e é feita por pessoas e para pessoas, indistintamente do género.
Existe algum trabalho que ainda não tenhas feito que sonhas no futuro fazer?
- Sim. Eu sou fã de Ionesco (gosto incutido pelo Malaquias de Lemos) e espero encenar e colocar em cena a peça “O rei está a morrer.
Existe algum trabalho que ainda não tenhas feito que sonhas no futuro fazer?
- Sim. Eu sou fã de Ionesco (gosto incutido pelo Malaquias de Lemos) e espero encenar e colocar em cena a peça “O rei está a morrer”.
Como música escolhi a “Primavera” de Vivaldi porque era a música que dava início à cena que interpretei em “As Quatro Estações”, de Romeu Correia – a minha estreia em teatro.
No dia em que se comemora o Dia Mundial do Teatro, deixo-vos a entrevista de alguem que admiro muito.
Conheci a Mafalda já nem sei muito bem como, mas partilhamos o mesmo amor pelo Teatro Amador.
Desejo-te que continues com essa garra que tens tido e que leves sempre em frente a tua vontade de fazer Teatro!!
Mafalda, tu és encenadora de um grupo de Teatro amador. Há quanto tempo desempenhas este "papel"?
- Comecei por adaptar e encenar dois contos tradicionais portugueses em 2002, quando o meu saudoso encenador Malaquias de Lemos já se encontrava debilitado.
Em efectivo, por passagem de testemunho do mesmo e compromisso da minha parte, assumi a encenação do grupo em 2003.
Foto do Grupo na peça "Biblioteca Encantada" de Iris Pitacas
Qual o grupo que estamos a falar?
-Falamos do Grupo Cénico da Sociedade Filarmónica Incrível Almadense, uma respeitosa Colectividade que caminha para os seus digníssimos 171 anos de vida activa e ininterrupta.
Também és actriz ou já foste?
- Fui e sou. Comecei no grupo Cénico da Incrível Almadense em 1997, como ponto. Por desistência de uma das actrizes que fazia o papel de Ester em “As Quatro Estações”, de Romeu Correia, foi forçoso subir ao palco.
A partir dessa altura o encenador não mais deixou de me atribuir papéis nas peças que encenava e, a partir de 2003 coube-me assumir o comando do grupo por falecimento do mesmo. Embora predominantemente seja encenadora, há alturas em que me vejo forçada a substituir alguma actriz que se ausente do grupo, para que o trabalho colectivo prossiga sem mais sobressaltos.
Trabalhar num grupo amador tem destas coisas.
Isto da encenação aconteceu por acaso?
- Não sei se lhe chame “acaso” ou “destino”. Ser encenadora não era algo que cogitasse. Tornei-me encenadora do grupo por força das circunstâncias ou, por outras palavras, porque o bem colectivo se sobrepunha ao particular. Não era uma função para a qual estivesse devidamente preparada mas, com a ajuda do que havia aprendido com o encenador e dos elementos mais antigos do grupo, com vasta experiência, acabei por ir desenvolvendo e aprimorando essa tarefa que hoje desempenho com agrado e entusiasmo.
Como te preparas, ou como preparas as encenações dos teus trabalhos?
- Eu gosto de trabalhar em colectivo e de envolver todo o grupo no trabalho do princípio ao fim.
Peço sugestões de peças e eu própria sugiro textos. Depois de ser aceite pelo grupo, “investigo” sobre o autor e a época. De seguida pego no texto e começo então a trabalhar a nível de encenação que, posteriormente, é debatida em grupo.
Quais são as maiores dificuldades, com que te debates?
- A primeira é a dificuldade financeira, que é comum a todos os grupos amadores, certamente. “não se fazem omeletes sem ovos””. Os recursos financeiros para se fazer a montagem de um espectáculo são difíceis de conseguir e ou há apoio das autarquias ou é incomportável desenvolver a actividade.
E, neste ponto, refira-se que me insurjo completamente contra a teoria de que os grupos são “subsídio-dependentes”. O ponto de partida está errado.
Os apoios que os grupos recebem para desenvolver uma actividade cultural ao serviço da comunidade não devem ser encarados como subsídios mas sim como um pagamento por um serviço prestado; serviço esse que compete ao Estado e que este não realiza por falta de condições/capacidade de o fazer ou mesmo vontade.
A segunda dificuldade que sinto é o tempo; os amadores estão condicionados na sua disponibilidade. Não é fácil coordenar um trabalho de acordo com as diferentes disponibilidades dos elementos do grupo porque, como sabemos, hoje em dia os empregos têm, cada vez mais, horários por turnos.
Conjugar o tempo disponível de todos é uma tarefa quase heróica.
Ser encenadora tem a ver com tua verdadeira profissão ?
- Não, nada. Sou técnica administrativa. Ser encenadora é uma actividade de lazer em primeiro lugar e um compromisso de participação na vida da comunidade e seu desenvolvimento cultural.
Qual a tua opinião sobre o estado do Teatro Amador em Portugal?
- É uma actividade que existe, insiste e persiste mas que continua a ser, cada vez mais, asfixiada.
Se o teatro profissional está a ser asfixiado, imagine-se então o amador, com menos recursos e apoios. Paralelamente a essas dificuldades deparamo-nos, ainda, com o ritmo de vida moderno, sempre a correr e sem tempo para nada, coadjuvado por uma cultura de mediocridade intelectual, repleta de programas de TV vazios de tudo e cheios de nada, de redes sociais onde imperam a frivolidade e mesquinhez.
Vais tendo casos de novas pessoas, a querer fazer Teatro e a disponibilizar-se para tal?
- Talvez por ter a sorte de viver na cidade denominada como “A cidade do teatro” me apareçam novas pessoas. Almada tem uma tradição muito vincada de teatro. É uma cidade “sui generis” nesse campo e de que muito me orgulho.
Apesar das dificuldades, de todos os cortes feitos à cultura, ainda subsistem e resistem mais de uma vintena de companhias de teatro na cidade.
Como adaptas a tua vida pessoal aos trabalhos no Grupo de Teatro?
- Não é fácil. Poucas horas de sono, pouco tempo para mim e para a família e muita força de vontade.
Por vezes os textos deambulam na mesa da cozinha entre a preparação das refeições ou entre a limpeza da casa e a arrumação das roupas.
Achas que ainda existe um estigma que este tipo de desempenho ( de encenadora), terá de ser feito apenas por homens?
- Acredito que haja, mas não aqui na minha cidade ou na minha colectividade. Nunca senti isso.
Já alguma vez colocaram em causa o teu trabalho por seres mulher?
- Não, nunca.
Deixa uma mensagem como mulher, sobre o Teatro
- O teatro não é uma actividade que se defina por sexo. É cultura e a cultura é de todos e para todos.
Alimenta-se do amor à arte e do intelecto e é feita por pessoas e para pessoas, indistintamente do género.
Existe algum trabalho que ainda não tenhas feito que sonhas no futuro fazer?
- Sim. Eu sou fã de Ionesco (gosto incutido pelo Malaquias de Lemos) e espero encenar e colocar em cena a peça “O rei está a morrer.
Existe algum trabalho que ainda não tenhas feito que sonhas no futuro fazer?
- Sim. Eu sou fã de Ionesco (gosto incutido pelo Malaquias de Lemos) e espero encenar e colocar em cena a peça “O rei está a morrer”.
Fico sempre fascinada com as tuas entrevistas *-*
ResponderEliminarAdorei!
A sério? Fico feliz por saber?
ResponderEliminarJá agora porquê?
Beijinhos.
Sandra C.
bluestrass.blogspot.com
Gosto deste tipo de posts , conhecemos pessoas muito interessantes.
ResponderEliminarGostei imenso da entrevista! Uma actividade que admiro, o teatro, pois sei que muito do bom teatro que ainda se vai fazendo, passa pela entrega total, de quem o faz, no meio de tanta limitação de vária ordem...
ResponderEliminarE as minhas actrizes favoritas, em televisão, confesso, que é onde tenho mais oportunidade de acompanhar o trabalho de muitos dos nossos actores... normalmente são aquelas, que desenvolveram muita da sua actividade em grupos de teatro... algumas durante anos e anos, e com pouco reconhecimento... como a Manuela Couto, por exemplo...
Beijinhos! Feliz domingo, e um óptimo Abril!
Ana