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Marina Oliveira- Criativamente Teatral




E porque hoje é Dia Mundial do Teatro, nunca poderia deixar passar este dia em branco, sem o assinalar significativamente.
Hoje, não serei eu a falar como habitualmente neste dia, hoje quem fala é uma das minhas actrizes de Teatro amador preferida, com quem me cruzei no palco e me diverti muito.
Ela não só me faz rir, como deste lado de cá do palco me fez emocionar e me fez ir ás lágrimas.
A minha grande Marina... espero que gostem tanto como eu!

A tua passagem pelo teatro não é de hoje. Em que ano te estreaste?
- Ui... a minha história com o Teatro começa no liceu D. Dinis em 1994. E tem muita piada.
Conheci o Miguel Mestre numa visita de estudo a Vila Nova de Mil Fontes.
Segundo ele, diz que ficou cativado por mim, pela minha cara e, atrevido, pediu para me tirar uma fotografia. Ele fazia parte do Clube de Ciências e já tinha feito uma peça lá na escola, o Auto do Corpo (in)Docente, e estava começar um novo projecto, o Bye Bye Baby, que tinha corpo de dança. Perguntou-me se eu queria fazer parte e eu aceitei. Esta foi a minha primeira experiência em Teatro. Eu que sou tão descoordenada... enfim.
Como actriz... foi mais tarde, no Teatro Contra-Senso, já andava na faculdade.

Recordas-te da personagem que fizeste? E da peça de teatro?
- Como actriz acho que foi na peça Coita d'Amor, uma comédia na temática das Cantigas de Amigo. Eu era Serafina, a mulher de Paulino, o homem do Pau, o que guardava A corte.

Em que te inspiras quando estás a criar uma personagem? 
- Inspiro-me no ser humano. Gosto muito de psicologia e de observar as pessoas e as suas relações.
O que é dito para além das palavras. Observo e interpreto muito o corpo.
Fiquei "fascinada" quando descobri que na comunicação cerca de 60% era não verbal (corpo), aproximadamente 30% entoação e só meros 6% ou 7% se devem às palavras.
E estas podem ter significados diferentes de pessoa para pessoa. Acho muito interessante explorar a comunicação não verbal de uma personagem quando a estou a criar.
Recorro também muito às minhas memórias. A mais recente e mais forte foi no Cemitério das Âncoras em que dei corpo, voz e alma a uma Mãe que perdeu o filho.
Apesar de ser Mãe... estou longe de imaginar a dor real de perder um filho, espero nunca vir a sentir, que se cumpra o desígnio natural de eu partir primeiro.
Então... para esta personagem apoiei-me na memória mais semelhante que tive... que foi quando o Gabriel se escondeu num armário no IKEA e o meu coração congelou. Foram uns meros 5 minutos mas passou tudo pela minha cabeça... o meu corpo impelia-me a correr de um lado para o outro e a gritar o seu nome... aqueles 5 minutos pareceram uma eternidade.
Quando a Filomena aparecia em palco pela primeira vez, mesmo em jeito de apresentar a personagem, era suposto eu ser uma velha louca que se passeava pela praia à procura sei lá bem de quê e então... ao som de Madredeus... lá desmoronava eu, como se estivesse a reviver o momento da notícia fatal, a correr de um lado para o outro do palco, incrédula. Mas respondendo mais directamente à pergunta... as pessoas são a minha maior inspiração, a psicologia... e sou muito corpo.
Uma ferramenta que desenvolvi no Grupo de Teatro do Técnico (GTIST) e nalgumas formações com o Teatro O Bando. Sou fascinada pela comunicação não verbal e o tanto que alguém nos diz sem palavras.

Tens preferência por personagens cómicas ou dramáticas?
- São ambas desafiantes, por motivos diferentes. As cómicas para fazer rir mas tentar fugir ao óbvio... ao fácil. As dramáticas... pela sua carga emocional e porque puxa mais pela interioridade.
Há que fazer um pouco de tudo. E eu gosto de experimentar coisas novas... nunca fiz de "má da fita", por exemplo.

Qual foi a personagem que mais gostaste de fazer? Porquê?
- A Filomena do Cemitério das Âncoras, de Miguel Mestre, com o Teatro Contra-Senso e 1988 de Vertigens, uma criação colectiva do GTIST com Susana Vidal.
A Filomena do Cemitério porque me fez conectar ainda mais com a sombra na maternidade... não dá para imaginar o que é perder o nosso bem mais precioso.
Deve ser uma insanidade constante. Lembro-me de pensar algumas vezes noutra Filomena, a Mãe do Rui Pedro, o menino que
desapareceu com  9 ou 10 anos.
Essa senhora é uma sombra dela própria... se quando um filho nasce, nasce também uma Mãe (e um Pai), quando um filho morre (ou desaparece), os Pais também morrem por dentro.
1988... estava particularmente inspirada e a Susana deu-me imenso "tempo de antena"... senti-me como uma flor a abrir. Tinha entrado para o grupo há pouco tempo, ainda me sentia intimidada pelos outros actores que eu tanto admirava... já havia participado em dois projectos  anteriores, de forma tímida mas cada vez mais envolvida.
No Vertigens sinto que cresci... que passei de menina a mulher. E pus em palco muito das minhas questões interiores sobre a sociedade da altura.

Consegues deixar cair a personagem assim que deixas os ensaios ou o espectáculo?
- Perfeitamente! São coisas totalmente distintas. No entanto, há personagens que levamos para casa porque nos fazem pensar sobre a condição humana, sobre ti próprio.
Acabam por ser um espelho no qual te vês reflectida e não há como ignorar.
É fazer o trabalho de enfrentar e aceitar/gostar do que se vê.

Fazes "teatro" para o teu filho?
- Faço muuuuito teatro para o meu filho! São as nossas brincadeiras mais habituais ou até mesmo as "truques" para ajudar a "controlar" momentos de maior stress, as vulgares "birras" (detesto esta palavra). Uma voz falsete, uma carantonha... e tenho logo um Gabriel mais atento e pré-disposto a colaborar.
Lemos muitas histórias e ele já gosta de dar a sua perninha no Teatro. Há dias na escola gostou tanto de ver uns colegas a fazer "O traseiro do Rei" que disse à Educadora que também quer ser o rei.
Será que é uma promessa?

O Teatro para ti é um hobby, conseguirias levar esta vida de uma forma mais séria e fazer disto a tua profissão?
- Gostaria de ter mais tempo para dedicar ao Teatro mas não profissionalmente.
Gosto de proteger a "minha Arte" e não ter de a sujeitar a outros valores, nomeadamente o do vil metal.
entanto, claro que gostava de poder estar mais tempo em cena... a produção de um espectáculo demora meses para depois termos 2 ou 3 actuações e isso custa-me imenso. Gostava também de ter mais tempo para pensar em projectos novos a desenvolver no Contra-Senso... residências artísticas com outras companhias de teatro e/ou mais formação a jovens... mas ser profissional de Teatro é muito duro (quem viu Actores no S. Luís de Marco Martins pode confirmar) e eu prefiro ficar com a "melhor" parte.
Acho igualmente que vejo o Teatro como activismo... mais um em que estou metida.
Eu sou uma pessoa de pôr as mãos na massa, de passar à acção... operacional.
Sou uma pessoa de causas e o Teatro permite chamar a atenção para o que quisermos dar destaque. Gosto disso!

Neste momento tens um novo desafio em mãos? Qual é? 
- Acabámos de apresentar 3 Graças & 6 Sentidos, de Miguel Mestre, onde fiz uma personagem diferente da que tinha feito quando estreámos a peça em 2001.
Desta vez representei uma mulher reprimida, submissa, deprimida... abusada e violentada pelo marido, o oposto de mim. Foi desafiante pelo contraste. Não dar vida àquele corpo já inanimado por dentro há tanto tempo... o que leva alguém (homem ou mulher) a sujeitar-se a uma relação assim? Enfim, esta já terminou.
A próxima aventura é a personagem Alteia, uma velha cega, a anciã de uma terreola, A Colina, de Miguel Mestre, que vai ser apresentado em Julho

Quando sobes para cima do palco vês alguma coisa ou alguém?
- Agora sim... mas já são muito anos, a experiência conta muito e ajuda a ultrapassar os nervos, a evitar brancas.
Se tenho oportunidade de o fazer em personagem, trato mesmo de passar o olhar pela plateia e ver se encontro caras conhecidas. Num registo controlado, claro!!

Achas que o palco tem um cheiro especial? 
- Tem pois! No GTIST era o linóleo... tinha mesmo um cheiro especial, o meu marido reconhecia sempre que passava na sala de ensaios. A sede do Contra-Senso tem outro cheiro.
Mas qualquer palco/linóleo não só tem cheiro como sabor.
E memórias. Lembra a saudade das folhas dos dias de Outono, tem o frescor dos dias de praia, acolhe como uma manta no Inverno e surpreende sempre como a Primavera.

Tens ideia que alguém que pisa o palco uma vez é picado pelo bichinho que lá mora e mais tarde ou mais cedo volta?
- Tenho a certeza que ninguém fica indiferente ao teatro... pode às vezes não ser o momento certo ainda, o "tempo" da pessoa para se aventurar mais mas se tiver mesmo de ser... lá chegará!

Uma mensagem sobre o Teatro e sobre a tua condição de mulher.
É um grande privilégio fazer teatro e uma responsabilidade... porque podemos dar tempo de antena às nossas questões interiores e à forma como vemos o mundo.
Ter espírito crítico é por demais importante e a Arte permite ser instrumento para pensar... sonhar, crescer... TRANSFORMAR!!!
Uma pequena e frágil lagarta sofre transformações brutais até ser uma bela borboleta. Não podemos ter medo da metamorfose.

Marina Oliveira

Algumas destas fotos foram cedidas pela Marina, mas também pela fotografa Lúcia Fernandes.

Espero que gostem e que festejem da melhor forma este dia do Teatro!
Sandra C.

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